terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Tantra



Depois de ler este texto da Ana Rita e verificar alguns relatos que consigo encontrar na minha vida de terapeuta, por isso o  transcrevo para que possa ser lido por outras pessoas

O tantra expande o universo de sensações e prazer. Conheça melhor essa prática e melhore sua vida amorosa e sexual.



Na infância, o sexo costuma ser um assunto misterioso, cercado de tabus. Na adolescência, quando colocamos em prática a busca do prazer a dois, a descoberta é tão forte que só queremos mais e mais. A maturidade, porém, chega e, com o tempo, percebemos que apenas a quantidade não nos satisfaz. Mais do que muito sexo, queremos sexo com qualidade. Apesar do desejo universal de prazer, pela troca, no entanto, quem pode dizer com sinceridade que se sente livre, leve e solto e completamente satisfeito entre quatro paredes?
Antes de responsabilizar o parceiro ou até mesmo a falta dele, vale tentar enxergar o sexo por uma outra perspectiva: a do tantra. Segundo esse complexo de conceitos filosóficos a respeito da vida surgido há mais de 5 mil anos na região da Caxemira, norte do Paquistão e da Índia, o sexo tem o potencial de nos colocar em contato com a nossa energia vital, a do outro e ainda desenvolver o autoconhecimento e a verdadeira intimidade. A chave, dizem os tântricos, é mudar a forma com que nos relacionamos com a sexualidade. E, claro, para isso há técnicas milenares de toque, controle da respiração e meditações que prometem levar os praticantes a sensações intensas e orgasmos nunca antes experimentados.
A advogada paulistana Mara Linhares, de 33 anos, pratica o tantra com o marido há três anos. Antes desse período, eles estavam prestes a se separar, pois viviam frustrados com o fato de Mara não sentir orgasmo nas relações sexuais. “Eu simplesmente não conseguia chegar lá, apesar de estar casada há cinco anos”, conta. Indicada por uma amiga, resolveu ir a um centro tântrico. Lá, um terapeuta ensinou para ela e o marido como despertar orgasmos poderosos um no corpo do outro. “Eu cheguei a chorar muitas vezes, pois a sensação do orgasmo é muito intensa, a ponto de causar vários espasmos. São ondas circulando pelo corpo inteiro. Perde-se a noção do tempo, do espaço”, relata. Na hora de transpor o conhecimento para os momentos íntimos, o casal também aprendeu a investir em posições confortáveis, justamente para poder prolongar a união sexual. Trocar de posição a todo momento, aliás, prejudica o processo de interiorização e percepção das sensações e, consequentemente, a obtenção do prazer. Quando o encaixe é menos amplo, essa é uma diferença fundamental do tantra para o Kama Sutra, dar e receber prazer passa a ser natural, sem a necessidade de ser performático. Casais tântricos, inclusive, costumam passar horas apenas se olhando e tocando levemente o corpo do parceiro antes da penetração. O que guia o ritmo é, sobretudo, o afeto e o cuidado; jamais a preocupação do ego com a virilidade e afins.
O brasileiro Deva Nishok, idealizador do centro tântrico Metamorfose, presente em várias capitais do país, conta que o tantra estimula o desenvolvimento da sexualidade por vias que normalmente não são exploradas: “As pessoas costumam se excitar sexualmente por meio de estímulos visuais e fantasias que atuam no hemisfério cerebral esquerdo, descem pela medula e causam resposta nos órgãos sexuais”, conta. “No tantra, o gatilho para a excitação não parte nem de estímulos visuais nem de fantasias eróticas, mas da percepção do toque do outro no próprio corpo. Quando se rompe o padrão “fantasiar para se excitar” e deixa-se o toque comandar a festa, mobilizá-se o hemisfério cerebral direito. Com ele na liderança, não há espaço para as racionalizações, julgamentos ou preocupação com a performance. Só para o desfrute”, completa.
Além de sugerir que nos excitemos por meio do toque e não da fantasia ou dos estímulos visuais, o tantra também busca uma mudança de padrão em relação à forma de tocar no outro. Durante as massagens, toda a pele deve ser estimulada de forma suave e contínua. “É preciso despertar a epiderme inteira para o prazer e não só a região genital”, ressalta o paulistano Evandro Palma, terapeuta tântrico e coordenador do centro Metamorfose. Tirar o foco apenas dos órgãos sexuais, ele conta, é fundamental para integrar todas as partes do organismo, deixando a energia sexual fluir e subir para os chakras superiores. “Só quando o corpo inteiro vibra de excitação é que os órgãos sexuais podem ser tocados”, completa.
Isso faz com que a visão tântrica sobre a masturbação seja bem diferente da que estamos acostumados a ouvir. Lembra dos sexólogos dizendo que tocar o próprio corpo é uma forma de se conhecer melhor e adquirir intimidade consigo mesmo? No tantra, a conversa é outra. “Os movimentos masturbatórios são repetitivos, viciantes, localizados e condicionantes. E o resultado deles é uma sensação fraca e efêmera”, diz o paulistano Evandro Palma. Ele diz ainda que a masturbação faz com que o corpo crie uma memória sensorial limitada, associando o prazer apenas à manipulação genital.



No tantra a rapidinha não tem vez
Mudar o jeito de expressar a sua sexualidade foi uma jornada difícil para o mineiro Fernando de Oliveira, 35 anos. O engenheiro sofria de ejaculação precoce e teve de aprender a diminuir o próprio ritmo para encontrar o prazer. “Fazer sexo para mim era como andar numa montanha-russa. Rápido, frenético. Eu me sentia bastante ansioso, não conseguia controlar nada. O orgasmo virava uma saída fraca para me aliviar. E depois eu ficava cansado e frustrado”, relata. “A relação entre o sexo e a ansiedade é muito comum e o tantra busca desvinculá-la. Quando o sexo torna-se tenso e mecânico, o que existe são duas pessoas que não se comunicam. É triste, mas a maioria se relaciona assim”, diz Isabelle Moura, terapeuta tântrica do centro Companhia do Ser. No caso do Fernando, aprender a relaxar, por meio de meditação e exercícios de respiração profunda, foi essencial para minar a ansiedade que levava à ejaculação precoce e à frustração. Conhecer o próprio corpo também: “Descobri, numa massagem em que a terapeuta movia as pontas dos dedos por toda a minha pele, dos pés a cabeça, que podia sentir muito prazer com o corpo todo. E que os estímulos numa velocidade mais lenta me ajudavam a controlar a hora de ter um orgasmo. Fora o fato de que ele vinha muito mais forte”, conta.
Difícil foi, ao começar a namorar, contar para a moça que frequentava um centro tântrico. “Você paga para uma mulher te fazer gozar?” “Sim, mas não é o que você está pensando...” “Meu Deus! Você frequenta uma casa de prostituição?” O jeito foi levar a mineira Rafaela Zardini, de 28 anos, ao centro. “Apesar de o terapeuta ficar de roupa e de o paciente não poder tocá-lo, no início foi estranho. Demorou para eu entender que é possível sentir prazer a partir de um toque e de uma experiência desvinculada do desejo”, ela conta. Depois da experiência, o casal fez um curso tântrico em que aprendeu como tocar no corpo do outro com calma, cuidado e a atenção voltada para o presente. Meditações com o uso de yantras – mandalas com figuras geométricas e padrões florais que representam a divindade feminina – e técnicas como a de vibração biodinâmica (ficavam em pé, de frente um para o outro, com as pernas flexionadas por cerca de 40 minutos) serviram para fazer a energia sexual – também chamada de kundalini – ascender para os chakras superiores do corpo. Fernando diz que, com três meses de prática, a ejaculação precoce sumiu. “Conseguimos unir o potencial pleno do corpo em sentir prazer ao afeto e, por fim, ao desejo”, conta.














Orgasmos transcendentais
No livro A Função do Orgasmo, o médico e cientista ucraniano Wilhelm Reich (1897-1957) desenvolveu a teoria de que, quando circula sem entraves, a energia sexual tem a função de harmonizar o corpo humano, gerando um estado de saúde perene.
O guru indiano Osho, que popularizou o tantra no Ocidente, nos anos 1960, vai além. Na publicação Do Sexo à Supraconsciência (editora Cultrix), ele diz que o sexo é a energia mais vibrante do homem, mas que não deve ser um fim em si mesmo, e sim um caminho até a alma. Mas o que a atividade sexual, teoricamente mundana, teria a ver com a espiritualidade? “O terapeuta tântrico toca o corpo do paciente de forma a estimular a energia sexual a circular pelos chakras, liberando-os de bloqueios. Trabalha-se todos, mas, sobretudo, o Muladhara, localizado no períneo, o Anahata (cardíaco, conhecido como o centro do amor) e o Vishuddha (localizado na garganta, relacionado à expressão e comunicação)”, explica Deva Nishok. “Quando esses centros estão alinhados e a energia circula livremente, a pessoa consegue acessar outros níveis de consciência e percepção. Então, durante um orgasmo, ela consegue sentir a fonte primária que conecta todos nós”, completa. Nishok chama isso de experiência oceânica e diz que ela não tem a ver com sedução, sensualidade, nem erotismo, mas com ausência do ego e conexão com o todo, valores primordialmente espirituais.

Apesar de ser budista, a aposentada capixaba Edite do Rosário, de 60 anos, não procurou um centro tântrico atrás da dimensão espiritual do sexo. “Eu queria me redescobrir sexualmente, mas achava que não era possível, pois estava na menopausa”, conta. O tantra ensinou à Edite que as mulheres são deusas sagradas por causa do dom da maternidade e uma fonte infinita de prazer, independentemente da idade.
Ela conta que surpreendeu-se ao sentir prazer na terceira idade. “Não estava acostumada. Muito menos com o fato de as sensações corporais provocadas pelas sessões de massagem às vezes durarem dias”, diz. Segundo o terapeuta Evandro Palma, isso é possível porque o toque terapêutico libera endorfina, serotonina e ocitocina, hormônios que causam sensações agradáveis no corpo. No caso das mulheres na menopausa, há ainda mais uma vantagem: a ocitocina é responsável também por aumentar a lubrificação íntima. “Agradeço aos terapeutas que me ensinaram a sentir prazer. E agora quero conhecer alguém com quem dividir esse aprendizado”, diz. E, sem saber, corrobora uma das máximas filosóficas do tantra: a de buscar compartilhar o conhecimento, o prazer e espalhar a felicidade pelo mundo.

Tantra versus kama sutra

Não é incomum as pessoas confundirem o tantra com o Kama Sutra, ou acharem que um deriva do outro. No entanto, não existe relação direta entre os dois. Surgido há mais de 5 mil anos na região da Caxemira, tantra significa “chave”, “técnica” e propõe o uso da energia sexual para atingir novas percepções e dimensões espirituais. Baseia-se na abertura e na receptividade, características essencialmente femininas. No tantra, o que se busca por meio das técnicas de toque é fazer a energia sexual circular pelo corpo inteiro para só então mobilizá-la para os órgãos sexuais. Antes do sexo, os parceiros devem se tocar bastante e, durante, é importante que se olhem nos olhos e fiquem numa posição o mais confortável possível. Já kama signifca prazer em sânscrito e sutra manual. O Kama Sutra é um texto indiano escrito por Vatsyayana Kamasutram, no início do século 4, que traz um guia com posições sexuais e tipos de beijo para a obtenção do prazer. Nele, o foco é a própria relação sexual e as possibilidades interativas entre o corpo feminino e o masculino (mesmo que nem todas sejam lá muito confortáveis). Apesar de os hindus considerarem o amor e o prazer um dos três pilares para a elevação espiritual (os outros dois são o dharma, mérito religioso, e a artha, aquisição de riquezas), no Kama Sutra não se fala da energia sexual e de como usá-la para ascender espiritualmente. Enquanto o tantra apresenta técnicas para desbloquear chacras e tornar pele e músculos mais sensíveis a essa energia, o Kama Sutra parece ser mais uma inspiração para a hora do vamos ver.

Texto: Ana Rita Martins



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